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Manoel Bento de Araújo (Mané de Coco) |
Manoel Bento de Araújo, vulgo Mané de Coco era um poeta de memória, pois tinha uma mente privilegiada guardando dentro do quengo mais de 400 versos.
O ENCONTRO DE MANÉ DE COCO E LAMPIÃO
– Jéfferson Desouza
Nas
bandas do Pernambuco
Desde
os tempos do cangaço
Quando
briga findava no braço
Na
pexeirada ou na bala
Que
até hoje se fala
Das
histórias de um caboclo
Sobre
ele falo um pouco
No
causo que agora conto
Que
foi o dia do encontro
De
Lampião e Mané de Coco.
A
Mané por uns cruzado
Deram
a tarefa covarde
De
ir em cidade e cidade
Pregar
uns cartaz de procurado
No
papel um retrato estampado
Com
a foto de Lampião
Em
baixo a descrição
Bandido,
saqueador, e bandoleiro
E
recompensa ao pistoleiro
Que
o trouxer vivo ou num caixão.
E
saiu Mané no seu jegue
Cumprindo
sua jornada
Pregando
‘inté’ de madrugada
Os
cartazes por onde passava
Mas
uma coisa lhe assombrava
-
E se com Lampião eu topar?
O
delegado pra lhe sossegar
Lhe
conferiu a garantia
Que
a muito Lampião se escondia
La
pras bandas do Ceará.
Mas
parece que a informação
Não
‘tava’ bem informada
Numa
certa madrugada
Uns
jagunços viram Mané
No
mato sem proteção qualquer
Dormindo
por riba do chapéu
Com
a bunda levantada pro céu
O
pobre Mané só sentiu
Quando
com cano do fuzil
O
jagunço cutucou-lhe o anel.
Mané
sentiu o cutucão
Bem
no meio do traseiro
De
olho fechado tremendo inteiro
Tateou
um troço roliço e fino
Pensou
“valhei Jesus minino”
Não
julgue mal esse coitado
Não
sou, nem quero ser ‘viado’
Mas
que isso seja o jumento, senhor
Que
quer me comer e seu troço afinou
Porque
se não for eu ‘tou’ é lascado.
Quando
Mané abriu o olho
Avistou
o que temia
Pensou
“esse é meu ultimo dia!”
Nessas
terras do sertão
Era
mesmo Lampião
E
um bando de cangaceiro
Perguntando
por dinheiro
Mané
disse “tem não senhor”
E
não me mate por favor
Mas
se matar, mate ligeiro.
Respondeu
o cangaceiro
-
Eu não sou nenhum covarde
Não
mato só por maldade
As
vezes mato por dinheiro
Junto
com meus companheiro
Só
fazemos nos proteger
E
pare logo de tremer
Pois
se não me esconde nada
Pegue
logo a estrada
Que
vou liberar você.
A
alegria durou pouco
Pois
o jagunço Séraz
Num
é que encontrou ‘os cartaz’
Entre
as coisas de Mané
Lampião
gritou: – O que é?
-
Esse cartaz de procurado?
-
Tu tá de acoite com os ‘sordado’!
Portanto
cabra se apresse
Em
fazer sua última prece
Que
tu vai ser fuzilado.
Mané
disse: meu capitão!
Me
permita se explicar
Se
o senhor me matar
Matará
um inocente
Ao
senhor eu sou temente
Nunca
lhe desejei um ‘má’
Eu
quero mesmo mostrar
Que
estou a lhe servir
Se
o senhor permitir
A
minha historia contar.
-
quando vi ‘esses cartaz’
Fiquei
muito indignado
Não
deixei um ‘apregado’
Pelos
cantos que passei
Ai
‘dispois’ eu pensei
Vou
deixar isso assim não
Vou
rodar todo o sertão
Arrancando
‘esses cartaz’
Pois
fraqueza dessa não se faz
Ao
meu nobre capitão.
Ai
sai no meu jegue
Cumprindo
minha jornada
Arrancando
‘inté’ alta madrugada
‘Esses
cartaz’ maldiçoado
Não
deixei um ‘apregado’
Rodando
o sertão sem medo algum
Embaixo
de sol, e as vez em jejum
E
no mato tiro ‘minhas pestana’
E
quando acaba a semana
Queimo
‘os cartaz’ e não deixo um.
-
E graças a deus esse encontro
Na
bolsa Mané enfiou a mão
Tirou
quatro pregos longos de vergalhão
E
disse tome cá esse presente
Lampião
disse descrente
-
Quatro prego? Tá brincando com eu?
Mané
disse “aceite o presente meu”
E
por favor não se ofenda
Essa
é um oferenda
Envia
pelo filho de Deus
Esses
pregos meu capitão
Vieram
do estrangeiro
Rodaram
o Brasil inteiro
Ate
chegar em minha cidade
E
o padre de lá por bondade
Sendo
seu admirador
A
tarefa me confiou
De
no dia que lhe encontrar
Esses
santo prego entregar
Não
próprias mãos do senhor.
Esses
pregos capitão
Foram
tirados da cruz
Eles
pregaram Jesus
No
dia de sua morte
São
objetos de sorte
Por
nosso senhor protegido
E
você foi escolhido
Pra
receber esse presente
E
garanto daqui pra frente
Por
tiro nunca será atingido.
Lampião
ficou contente
Por
ser um homem de fé
Abraçou,
agradeceu Mané
Aquele
presente de Deus
Com
os pregos na mão se benzeu
‘Tava’
protegido por cristo
-
Mané vou lhe recompensar por isto
Mas
tudo ficou ameaçado
Quando
veio cismado do outro lado
Pedindo
palavra o jagunço Curisco.
-
Lampião me desculpe
Mas
este cabra lhe enganou
Pois
pra pregar nosso senhor
Só
três pregos foram usado
Um
pregado em cada braço
E
só um pregando os ‘dois pé’
Um
mais dois dá três, não é?
Então
tem prego ai sobrando!
Lampião
apontou a arma gritando
-
É melhor tu se explicar Mané!.
Mas
Mané é cabra esperto
E
disse de prontidão
-
Vocês num se alembra não?
Na
cruz tinha uma placa pregada
E
nela uma frase talhada
A
pois esse prego veio de lá
E
se a memória não falhar
Lá
‘tava’ escrito o firmamento
O
primeiro mandamento
“É
proibido matar!”.
Lampião
sabia que a frase na cruz
Dizia
“Jesus, Rei dos Judeus”
E
que o mandamento de Deus
“Não
matarás” não é o primeiro
Mas
liberou Mané são e inteiro
Viu
sua inteligência como proeza
E
vocês podem ter certeza
Que
pra viver por mais um dia
Ou
o cabra usa da valentia
Ou
se vale da esperteza.